“Não tenho nenhuma utilidade para o sonho de um futuro melhor, nem o meu pessoalmente nem o chamado "futuro da humanidade" que, francamente, da minha perspectiva atual, parece um desastre de trem em câmera lenta.”
Robert Saltzman
Tenho observado ultimamente um excesso de artigos e pessoas falando sobre o futuro, especialmente o futuro do trabalho e a uma “liderança do futuro”. Aprendi a duras penas que o futuro não existe. É só uma visão na minha mente, fruto de uma imaginação fértil que sempre tive. Futuro mesmo, só acontece agora neste momento, porque quando eu chegar ao futuro, ele será presente e assim como o passado que também não existe, ambos acontecem aqui e agora. Portanto imaginar possibilidades é um ótimo exercício, mas apenas isso.
Ora, se isso for verdade, essa quantidade de gente gastando tempo para falar de futuro enquanto nossas instituições e organizações (assim como seus líderes em sua maioria) continuam arcaicas, estagnadas ou retrocedendo no tempo, me parece um gasto inútil de energia. E isso vale também para as empresas supostamente inovadoras e de ponta, as big techs que ao contrário de estarem evoluindo, voltaram pelo menos 10 anos no tempo nas relações humanas, inspirados por seu guru, o sujeito que colocou um carro para ficar voando em volta da Terra, que domina toda a rede de satélites de acesso a internet, que exige mais de 80 horas de trabalho de seus “fanáticos” colaboradores (parece que atualmente não são tão fanáticos) e que tem empresas cujo valor despencou. Mas tergiverso.
Aqui, a frase que eu gostaria de destacar nesse momento paradoxal que vivemos seria esta:
“O verdadeiro problema da humanidade é o seguinte: temos emoções paleolíticas, instituições medievais e tecnologia divina.”
Edward O. Wilson
Ironias à parte, vamos direto ao ponto:
O trabalho de hoje condena nosso futuro. Enquanto debatemos incansavelmente sobre o "futuro do trabalho", continuamos presos em estruturas organizacionais do século passado. Comando e controle não são apenas vestígios ultrapassados - são manifestações de um ego coletivo que fragmenta nossa experiência, que nos separa uns dos outros e de nós mesmos.
A recente obsessão com o retorno forçado ao escritório revela nossa incapacidade de transcender a dualidade que define nossas organizações: líderes e liderados, ou produtividade ou bem-estar, ou lucro ou propósito. Essas falsas dicotomias surgem de uma consciência fragmentada que não consegue perceber a interconexão de todas as coisas. Não precisamos apenas de novos métodos de trabalho – precisamos de uma nova Consciência no trabalho.
Esta contradição não é sustentável. O ego organizacional que impõe controle está em guerra com nossa natureza mais profunda – aquela que floresce em estados de flow, onde a ação e a consciência se fundem, onde o tempo se dissolve e o trabalho se torna uma extensão natural de quem somos. É precisamente essa experiência de flow que nossas estruturas atuais sufocam com sua obsessão por métricas, vigilância e fragmentação da atenção.
A verdadeira revolução depende da emergência da liderança consciente – líderes que operam além do ego, que reconhecem que sua verdadeira função não é controlar, mas criar condições para que a consciência coletiva floresça. Estes líderes compreendem que não há separação real entre seu bem-estar e o de suas equipes, entre o sucesso organizacional e o florescimento humano. Eles transcenderam a dualidade do "nós versus eles" para abraçar a não-dualidade do "somos todos".
Quando um líder opera a partir do campo da não-dualidade, a organização inteira começa a se transformar. A confiança substitui o controle não como estratégia, mas como expressão natural de uma consciência expandida. As pessoas não são motivadas por medo ou recompensa, mas pela óbvia e inerente alegria de expressar seus dons e talentos a serviço de um propósito maior que elas mesmas. O trabalho torna-se uma prática de presença, não uma luta por resultados.
O estado de flow, tão fugaz e inconstante em nossos ambientes fragmentados, torna-se o estado natural quando as barreiras do ego – individual e organizacional – começam a se dissolver. Neste estado, não há separação entre o trabalhador e o trabalho, entre o líder e o liderado, entre propósito pessoal e missão organizacional. Há apenas o fluir da criatividade, da colaboração, da consciência compartilhada.
A urgência não poderia ser maior. Não estamos apenas falando sobre reformar organizações – estamos falando sobre uma evolução da Consciência que se manifesta através de nossas instituições. Cada dia que perpetuamos estruturas baseadas no ego é um dia a mais em que sufocamos nossa capacidade coletiva de operar de um lugar de maior Consciência, de não-dualidade, de flow.
Esta não é uma utopia inalcançável – poderia ser o próximo passo evolutivo do trabalho humano. Organizações pioneiras já demonstram que quando a liderança consciente prevalece, quando o ego institucional é transcendido, emerge uma forma de trabalhar que é simultaneamente mais humana e mais eficaz, mais compassiva e mais inovadora, mais profunda e mais produtiva.
A necessária ruptura começa quando reconhecemos que o problema não está apenas nas estruturas externas, mas na Consciência que as cria. Liderança Consciente não deveria ser mais um rótulo ou apenas uma nova técnica gerencial – é uma transformação fundamental na forma como percebemos a nós mesmos e aos outros no contexto do trabalho. É uma expansão de identidade que transcende o ego individual para abraçar uma Consciência mais ampla, onde não existe "eu" separado de "vocês", onde o líder e o liderado são expressões diferentes da mesma Consciência que nos “anima” a todos.
Nossa humanidade, pelo andar da carruagem, está fadada à extinção – mas poderia estar pronta para sua próxima evolução.
O caminho à frente não passa por mais controle ou mais tecnologia, mas por mais Consciência. A “liderança do futuro” – fruto do presente que precisamos urgentemente criar – é aquela que transcende o ego, abraça a não-dualidade e cria as condições para o flow coletivo. Reforço este ponto sempre que posso.
O “futuro do trabalho” só vai acontecer quando tivermos a coragem de trabalhar a partir de um novo nível de Consciência, “prá ontem”, como dizia um antigo chefe meu, ou “enquanto estou jovem”, como diz a minha mulher.