O Que Nunca Precisou Ser Encontrado
Uma tentativa dual de criar vislumbres não duais. Ensaio com dois momentos.
Houve um tempo em que eu acreditava em reencarnação. Havia lógica na explicação de que temos uma alma que se desloca para algum lugar após a morte, cumpre algum tipo de protocolo e então vai se vestir como um novo personagem em algum lugar do planeta. Ou fora dele.
A lógica vinha do medo. O sentimento atávico do deixar de existir. Todos, sem exceção, carregamos esse sentimento. O que nos faz, em algum momento, parte de uma longa fila de crentes na salvação que nos foi vendida desde sempre pelos manipuladores de massa que, com o poder obtido, já não deixaram mais de exerce-lo.
A esperança de corrigir erros do passado ou reencontrar entes queridos já falecidos alimenta essa ilusão. O processo é tão elaborado que, nas tradições hinduístas e outras filosofias orientais, a busca pela salvação ou pelo nirvana é justificada - aquele estado onde finalmente chegamos e não precisamos mais retornar, nós libertando da roda da vida e do ciclo infinito de reencarnações necessário para expiar nossos pecados.
Pela minha própria experiência - portanto este é um ponto de vista estritamente pessoal - a coisa é muito mais simples, chega a ser ridiculamente óbvia.
Não há alma, não há morte. Há um processo, um fluxo contínuo de vida e morte de seres "animados" por uma única Consciência que envolve tudo o que nos rodeia. Nossos "aparatos corpo/mente" são parte dessa Consciência, mas que também tem uma individualidade consciente, que é fruto das experiências, formação, condicionamentos, valores e jornadas pessoais. As duas, "Consciência e consciência" são a mesma coisa. Não dois. Dentro e fora, acima e abaixo, forma é vazio, vazio é forma.
Este pensamento completamente fora do comum, daquilo que é tido como bom senso, tem feito muito sentido para mim de uns tempos para cá. Não são tempos tão recentes, já que minha "busca" começou na adolescência, mas o entendimento ou a ficha caída só aconteceram quando eu já estava quase nos meus 60 anos. Foi uma jornada relativamente longa, mas muito interessante para um curioso contumaz como eu sempre fui.
Desde os 14 ou 15 anos, mesmo antes, algumas perguntas me perseguiram sem descanso. A primeira delas, era: e se nada existisse? Era fruto dos meus sustos noturnos, quando eu acordava imaginando que nada existia, apenas um imenso espaço ora todo branco, ora todo negro, de um escuro profundo. Nada ali, ninguém, um grande nada, um grande vazio, e eu me via ali, sozinho. Pois ao que me parece, essa é a realidade da nossa natureza. Um enorme espaço vazio que tudo acolhe, todas essas manifestações "físicas", materiais, de pessoas, objetos, seres animados e inanimados que são parte de algo que se parece com um grande sonho que nos abraça. Somos este espaço Consciente.
Esse espaço vazio, num conceito absoluto, é nossa real natureza. Num conceito relativo, revela-se como a própria Consciência Una que, permanecendo como contexto imutável, manifesta-se simultaneamente como todo conteúdo aparente - não havendo separação real entre o que observa, o observado e o processo de observação.
Essa é apenas uma das muitas maneiras de interpretar algo quase surreal, que não tem um sentido aparente. Afinal, se há apenas Consciência manifestada em formas de vida separadas apenas como conceito físico, e se não há "dois", escrevo estas linhas para mim mesmo, aquele mesmo que também está lendo agora enquanto segura algum aparato que pode ser um livro, um smartphone ou um tablet. Ou talvez, já que estamos imersos em tecnologia, uma projeção a partir de nossa própria íris…
Se, por apenas um momento, levarmos em consideração essa proposta, algo muito significativo acontece: uma mudança de perspectiva, onde não há mais sujeito e objeto, apenas a ação em si, qualquer que seja ela. Não olho mais para você. Existe apenas "o olhar". Não ouço Miles Davis na caixa de som ao meu lado, existe apenas o ouvir.
As coisas vão acontecendo como têm que acontecer, por si mesmas, sem nenhuma interferência do que quer que seja. É o que É. Não escolho, apenas deixo que aconteça, qualquer objeção ou resistência é fútil, já que o processo vai acontecer de qualquer maneira, independentemente do que minha mente ou meu ego queiram.
O Wu Wei, conceito do Tao, já falava disso, assim como algumas tradições filosóficas e espirituais, mas meu ponto aqui é sair de perto dessas referências e apresentar uma visão mais pragmática e objetiva desse fenômeno que, equivocadamente, alguns chamam de iluminação ou despertar. Não existe nada disso (baseado, como sempre, apenas na minha experiência - mas aparentemente essa experiência é frequente com outros exploradores).
O que, na minha experiência - de novo - existe, é um relembrar, um re-conhecer. Ao remover as camadas que nos cegam à realidade, camadas estas formadas por uma mente inquieta e que pensa que é independente, nós, qualquer um de nós, pode se dar conta da simplicidade desse entendimento e de quanto tempo, energia e dinheiro se gasta para atravessar uma fronteira que não existe.
Essas camadas ou véus que nos são impostos por uma crença inútil e equivocada de que somos independentes e separados do mundo, não são difíceis de remover. Qualquer um, repito, qualquer um de nós pode fazer isso se, e somente se, realmente estiver imbuído genuinamente do propósito de buscar uma resposta às suas questões mais incômodas, aquelas perguntas que, em algum momento da vida, todos nós nos fazemos. Pensando melhor, nem todos nós fazemos tais perguntas. A força do sonho (está mais para delírio) coletivo é enorme, não dá folga.
Mas se de fato estamos dispostos a ir fundo nesse processo de maturidade e deixar a infância e adolescência de verdade para trás, aqui vou tentar trazer elementos que possam ajudar nessa empreitada.
A maioria de nós, humanos, foi condicionada a algumas regras sociais desde sempre. Foram, claro, evoluindo as regras com o passar do tempo e de acordo com os ambientes e épocas em que se vivia. Algumas coisas nunca mudaram, a saber: somos separados, temos nome e vida independente e própria, num mundo hostil onde temos que nos defender e se espera que prosperemos e alcancemos nossa melhor versão (ugh).
E assim seguimos, como autômatos, sem um mínimo questionamento do sentido disso. Fato agravado pela disputa de poder travada por sua atenção e recursos, a saber, as religiões, as redes sociais, os políticos e congêneres.
Estamos, sem saber, aprisionados numa gaiola sem grades, onde o fato de não exercermos um mínimo de pensamento crítico e reflexão nos condenam a repetir comportamentos automáticos ad nauseam.
A ruptura dessa condição é possível, mas demanda esforço e intenção. Para muitos, como disse Morpheus a Neo em Matrix, não vale a pena mudar e tudo está tão bom e confortável assim, que são capazes de lutar para manter essa condição.
Sair do sonho ou da Matrix é uma decisão sem volta no caso daquele que assim deseja e realmente consegue obter o entendimento da sua pobre condição, o que o levará a uma morte em vida. Não há morbidez nessa frase, mas a morte é real. Morrem todos os valores, crenças, visões de mundo, passado, futuro desejado, posses, entes queridos, tudo some de uma vez, deixando o indivíduo numa queda infinita sem que atinja o chão. E essa é a boa notícia.
A questão aqui é que essa mudança de perspectiva é contundente e definitiva. Uma vez realizado o vislumbre, o relance da Consciência olhando para si mesma, nunca mais se deixa de acessar esse estado, que na verdade é muito simples e imediato, porque sempre esteve ali. Sempre foi assim. Quem, ou melhor ainda, "o que" percebe o perceber? Quem está escrevendo estas palavras sem ter a menor ideia de onde elas vêm?
Um passo atrás é o que costumo dar quando quero retomar essa experiência inominável e inesquecível já que, desde a primeira vez, não passou um dia sequer sem que eu tenha acessado esse espaço infinito e absoluto que tudo abraça, sem resistência, sem julgamento, com verdadeira equanimidade.
Se sou um só com o todo, qualquer atitude minha se refletirá inevitavelmente em mim mesmo.
A maturidade está imediatamente relacionada ao fato de compreender a não separação, à inevitabilidade da vida em seus melhores e piores momentos e à aceitação das coisas como são. Se deixar levar sem resistir, fazendo aquilo que é pertinente para cada momento e compreendendo que a maior razão do sentido da vida é exatamente vivê-la em sua inteireza, com o que é bom e o que não é.
Não há um agente que seja o fazedor. Apenas o fazer, o sentir a cada instante, não há tempo linear, só há o agora. Esse momento que já passou. Morreu e outro nasceu imediatamente. Não se respira no passado nem no futuro.
Pensar que se pode evitar alguma situação que surge ou querer muito que algo diferente ocorra é puro delírio. Tudo vai acontecer porque tem que acontecer e não é nem nunca foi pessoal.
Somos como redemoinhos no mar que parecem diferentes, mas ao se esgotarem se fundem ao conteúdo maior que os cerca.
E nada fica. E tudo está lá.
Eu sei. Você deve estar pensando que aqui só tem teoria. Mas falo por uma experiência vivida e, como eu, muitos relatam situações semelhantes. Este processo não tem receita, mas tem um caminho direto. A auto investigação. No meu caso, o processo que funcionou tem nome e tradição: Neti Neti.
Não isso, não aquilo.1
Você começa por remover camadas e cargas que traz desde que nasceu. Seu nome. Seu passado. Seus amigos e família. Sua trajetória, seus bens e seus desejos de futuro, sua imaginação. Comece deixando tudo isso de fora de uma sala imaginária onde, em instantes, você vai entrar.
Não se preocupe, você pode pegar tudo de volta depois. Se quiser. Medo e dúvida se apresentam. Crescer dói e os adolescentes certamente vão preferir as atrações que já estão habituados ao processo que pode tirar tudo isso deles num átimo.
O choque, se acontecer, traz algumas reações já compartilhadas por diversos autores. Uma surpresa com a obviedade, com a simplicidade, algo que beira o impossível. Afinal, como não me dei conta disso em nenhum momento depois de anos de meditação?
Ou ainda, aqueles que experimentam esse momento sem nunca ter procurado por ele, o que, em alguns casos, causa profunda desorientação e até mesmo depressão. Depressão ou sentimentos de perda de uma história que se acreditava ser real e pessoal, aquela que representava uma identidade, uma personalidade, uma vida. Sim, é uma perda considerável e nem todos vão se recuperar rapidamente, mas ao mesmo tempo é um formidável momento em que tudo, finalmente, parece fazer sentido, se encaixar. Toda a busca faz sentido agora, todos esses anos de esforço ganham propósito, mesmo quando a resposta surge espontaneamente.
"Como não percebi isso antes?", perguntei eu mesmo, incrédulo com o que eu experienciei. Não havia busca, nem destino a perseguir. Tudo já estava aqui, sempre esteve. Eu nunca percebi. E agora, não consigo esquecer.
MOMENTO DOIS - Revisado por parágrafos:
No texto abaixo, aponto os principais impasses que surgem quando tentamos expressar a não-dualidade usando linguagem dual, como fiz no texto original acima. O foco é uma leitura crítica do mesmo texto, a partir da abordagem mais direta, sem concessões conceituais.
As contradições aparecem logo de início: uma narrativa pessoal estruturada (“minha jornada”) que afirma a inexistência da separação. A Consciência é tratada como algo que pode ser acessado, quando ela é o que percebe, nunca o percebido. O tempo é negado, mas o discurso segue linear, dividido entre antes e depois da realização. Recomendam-se práticas, o que pressupõe um praticante. E a realização, que é o reconhecimento da obviedade, ganha um tom especial, quase místico.
Na visão mais direta, nunca houve alguém para realizar coisa alguma. Nada foi conquistado. O que somos não pode ser experienciado, apenas reconhecido — e mesmo isso já diz demais.
Nenhuma resposta será oferecida, apenas o convite para ver por si mesmo se há, de fato, algo ou alguém por trás dos pensamentos, emoções e histórias que carregamos. É uma pausa na busca por sentido para olhar de frente o que já está aqui, agora. A jornada é para dentro, para um lugar onde a busca se dissolve porque nunca houve algo a encontrar.
Vamos lá então:
Desconstruindo a visão dual e habitual
O próprio ato de escrever este texto é paradoxal. Uso a linguagem para apontar além dela. Afirmo que não há separação enquanto construo frases que dependem do dois — sujeito e objeto, eu e você, aqui e ali. Mas talvez seja nesse esforço contraditório que algo se revele. Não apesar do paradoxo, mas por causa dele.
Houve um tempo em que eu acreditava em reencarnação. Parecia lógico pensar que temos uma alma que segue para algum lugar depois da morte. Mas quem é esse “eu” que acreditava? Onde está agora o crente que teria mudado de ideia?
A tal lógica nascia do medo — aquele medo antigo, visceral, de deixar de existir. Todos o conhecemos, em maior ou menor grau. Mas pare um instante e investigue: quem é que carrega esse medo? Consegue encontrar esse “carregador” separado da própria sensação? Ou o que há é simplesmente o medo surgindo, sem um alguém por trás dele?
A esperança de corrigir erros, de reencontrar pessoas queridas, alimenta narrativas elaboradas sobre salvação. Mas olhe direto, sem pensar: onde estão esses “erros” que supostamente precisam de conserto? Estariam no passado? E onde, afinal, esse passado se localiza — além da memória que agora se apresenta? E esse “você” que teria errado... consegue localizá-lo fora do pensamento atual sobre ele?
Eu dizia que meu “relembrar” foi a partir da minha experiência que ... mas espera um pouco... De quem é essa experiência? Procure pelo dono dela. O que encontramos além do próprio experienciar, acontecendo sem centro, sem dono?
Tudo isso é muito mais simples do que parece — até ridiculamente óbvio. Não há alma, porque... quem teria uma alma? Não há morte, porque... quem morreria? O corpo físico sim, mas estamos falando de outra coisa. Não pense. Deixe que o ‘insight’ surja. Há apenas um fluxo de manifestações: corpos, pensamentos, sensações — mas onde está o “eu” separado disso tudo que poderia observar ou controlar esse fluxo?
Esse meu “entendimento” não chegou aos quase 60 anos de idade. Quando olho para trás tentando identificar o momento da descoberta, o que aparece? Apenas memórias — surgindo agora. E quem se lembra? Há um lembrador à parte das lembranças, ou apenas o lembrar acontecendo?
Desde a pré adolescência, algumas perguntas me acompanhavam. “E se nada existisse?” Mas quem fazia essas perguntas? Tentei localizar esse questionador. Havia alguém separado do próprio perguntar, ou apenas o movimento do questionamento surgindo espontaneamente?
E agora, me diga você, ao ler estas palavras — quem está lendo? Há um leitor distinto das palavras? Ou há apenas leitura, acontecendo? Pare. Veja diretamente. Não pense — olhe.
Se não há dois, se somos um só com o todo... então, quem escreve? E para quem? De onde vêm estas palavras, se não sei de onde vêm? Há um escritor aqui? Há um leitor aí? Ou há apenas... isto?
Quando olho para alguém, o que realmente está acontecendo? Há alguém aqui olhando para alguém ali? Ou só olhar, sem direção, sem centro, sem distância?
“As coisas acontecem como têm que acontecer”, ouvi isso a vida inteira. Mas quem é que não está escolhendo? Procure esse “não-escolhedor”. Há alguém se deixando levar, ou só o acontecer — sem agente?
Não existe iluminação. Mas quem sabe disso? Não há despertar. Mas quem está acordado para perceber que não há despertar? Vê a armadilha? Até na negação há alguém negando. Quem?
O que existe é um re-conhecer. Mas quem reconhece? E ao falar em remover as camadas que nos cegam... quem remove? Onde estão essas camadas, além do pensamento sobre elas surgindo agora?
Diz-se que qualquer um pode se dar conta dessa simplicidade. Mas onde está esse “qualquer um”? Quem se dá conta? Quem percebe? Há alguém fora da própria percepção?
Fomos condicionados desde sempre. Mas quem foi condicionado? Tente encontrar essa pessoa condicionada. Há alguém atrás dos condicionamentos, ou só padrões vindo e indo?
Estamos presos numa gaiola sem grades. Mas quem está preso? Onde está essa gaiola, além do conceito “gaiola” emergindo neste instante? E quem conceituou? Há um conceituador distinto dos conceitos?
A ruptura dessa condição é possível. Mas para quem? Quem está em alguma condição que possa ser rompida? Há alguém para sair da Matrix, ou a própria ideia de “alguém preso” é parte da Matrix?
Quando essa mudança acontece, todos os valores, crenças, visões de mundo desaparecem de uma vez. Mas quem os possuía? Onde estavam guardados? Existe mesmo um possuidor, ou “possuir” é apenas mais uma ideia surgindo?
Dizem que, uma vez vislumbrado, nunca mais se deixa de acessar esse “estado”. Mas quem acessa? Há alguém separado desse estado, ou “estado” é só uma palavra para tentar nomear o que sempre é?
Quem percebe o perceber? Essa pergunta pode dissolver quem a faz. Não busque a resposta. Veja. O que encontra quando procura pelo percebedor?
Às vezes digo que dou um passo atrás para retomar essa experiência. Mas quem dá esse passo? E para onde é “atrás”? Quem quer retomar? Há alguém separado da própria experiência que busca retomá-la?
Se sou um só com o todo... quem sabe disso? Há alguém fora do todo para ser “um” com ele?
Não há agente fazedor. Há só o fazer. Mas quem sabe disso? Não há tempo linear — só o agora. Mas para quem é esse agora? Quem vive esse “só agora”?
Somos como redemoinhos no mar. Mas quem faz essa comparação? Há alguém fora dos redemoinhos, observando-os se fundirem ao mar?
Falo por experiência vivida. Mas quem viveu? Onde está aquele que viveu, além da lembrança emergente?
Esse processo não tem fórmula, mas aponta para um caminho direto: a auto-investigação. Mas quem se investiga? Há um investigador separado do investigado? Quando pergunto “quem sou eu?”, quem está perguntando?
Uma abordagem que usei pessoalmente:
Neti Neti — não isso, não aquilo. Camadas vêm sendo retiradas desde que nascemos. Mas quem nasceu? Onde estão essas camadas? Quem as remove?
Imagine esvaziar uma sala de tudo. Mas quem imagina? Há um imaginador fora da própria imaginação? E quem entra nessa sala? Há alguém além do entrar?
O choque é a surpresa pela obviedade. “Como não vi isso antes?” Mas quem não viu? Quando foi esse “antes”? Há alguém fora da percepção que poderia ter visto ou não visto?
“Como não percebi isso antes?” Mas quem não percebeu? Há um perceptor fora da percepção, capaz de perceber ou não?
Não havia busca. Nem destino. Tudo já estava aqui. Mas quem sabe que não havia busca? Para quem tudo já estava aqui? Quem nunca percebeu — e agora não consegue mais esquecer?
Olhe agora: quem está lendo estas palavras? Há alguém aqui lendo sobre a ausência de alguém? Percebe o paradoxo?
A questão não é entender isso com a mente. A questão é: consegue encontrar esse “você” que entende ou não entende?
Não se trata de filosofia, isso é um convite. Não para saber para onde olhar, mas para investigar: Quem olha ou melhor ainda, o que olha? E de onde?
Se tudo o que chamamos de “eu” é composto por pensamentos e memórias que surgem neste instante, o que sobra quando paramos de acreditar neles? Este texto não traz uma conclusão, nem oferece solução. Ele aponta para um caminho direto: olhar com atenção e honestidade para a estrutura da experiência. A pergunta “quem sou eu?” não busca uma nova identidade — ela desmancha a necessidade de uma.
A investigação é simples. O desafio é manter o olhar.
"É, bem, você sabe, isso é apenas, tipo, sua opinião, cara."
- O Grande Lebowski
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Neti Neti: expressão sânscrita que significa “não isto, não aquilo”. É um método de investigação da tradição Advaita Vedānta, em que tudo o que pode ser percebido, pensado ou experienciado — corpo, mente, emoções, pensamentos, sensações — é sistematicamente negado. O que resta é aquilo que não pode ser negado: a própria Consciência que tudo percebe. O processo pergunta: “Sou o corpo? Não, porque percebo o corpo. Sou os pensamentos? Não, porque observo os pensamentos.” E assim por diante. Até a última pergunta: “Quem sou eu que percebe tudo isso?”